Pedido de vista em fim de sessão dá sobrevida a proposta do Executivo fadada a ser reprovada pela Câmara: a troca de uma dívida milionária por poços profundos entre a Prefeitura de Marília e o Daem. Ordem do dia acaba sem votação de nenhum projeto
Acostumada à inadimplência e ao uso indiscriminado de água e esgoto ao longo das últimas três décadas em centenas de imóveis espalhados pela cidade, a Prefeitura de Marília passou, enfim, pela experiência do corte. E não foi por sua própria autarquia, ainda. O serviço, mesmo que incompleto, coube à Câmara Municipal de Marília, em sessão remota realizada na noite desta segunda-feira (15).
A proposta do Executivo da troca de uma dívida milionária por poços profundos com o Departamento de Água e Esgoto de Marília (Daem), que havia fluído sem muitos desvios pelo plenário há treze meses – aprovação por 10 a 3, em 1ª Discussão – ‘deu água’ desta vez: fadada a ser reprovada, só manteve o curso da tramitação após um pedido de vista no fim da sessão.
Àquela altura, após mais de duas horas e meia de debate, pelo menos quatro dos 13 vereadores – Luiz Eduardo Nardi (Podemos), Maurício Roberto (PP) e os tucanos José Luiz Queiroz e Delegado Wilson Damasceno – já haviam manifestado serem contra o projeto.
O quinto contrário seria Danilo da Saúde (PSB). Por se tratar de votação qualificada (dois terços), o projeto teria que receber ao menos nove votos para ser aprovado. Diante do risco iminente da derrota – e consequente arquivamento do projeto – Marcos Custódio (Podemos) pediu vista. O plenário acatou, e por unanimidade.
‘SURPRESA’ JURÍDICA
Custódio convenceu os colegas a aguardarem por esclarecimentos a respeito da judicialização de recente parcelamento das dívidas entre a prefeitura e o Daem. Entre as soluções tratadas em acordo entre as partes estaria o ‘pagamento’ através da dação de poços à autarquia. “É uma questão menos política e mais jurídica”, argumentou o vereador.
Acionado pelo gabinete, o líder do Executivo na Câmara, José Carlos Albuquerque (PSDB), incrementou a oferta pró-vistas: “o prefeito (Daniel Alonso) assumiu o compromisso de encaminhar a cópia do processo para o gabinete de cada vereador”.
A gentileza tardia irritou o presidente da Câmara, Marcos Rezende (PSD). “Isso já era para ter sido feito faz tempo. É uma falta de respeito com o Legislativo”, criticou. O impasse judicial com o Daem não havia sido mencionado formalmente pelo Executivo desde o protocolo do projeto, em agosto de 2018.
CONTRÁRIOS
Por conta do pedido de vista, a proposta irá direto para votação quando retornar à pauta – o que pode ocorrer já na próxima segunda-feira (22). O rito regimental não é para menos: o debate sobre o assunto avançou a ponto de encerrar a sessão por limite de horário.
A maioria dos vereadores manifestou-se sobre o assunto. Luiz Eduardo Nardi (Podemos) abriu a fila entre os que se opõem. Ele questionou o valor da dívida em R$ 12,9 milhões – “além de estar desatualizada, não se sabe o critério” – e afirmou que “o erro do projeto está na essência”.
Para Wilson Damasceno (PSDB), a proposta “vem na contramão da viabilidade do departamento”. “A aprovação seria nada mais do que institucionalizar o calote”, afirmou. “Que exemplo o gestor público dá à população que paga sua conta em dia?”, indagou Maurício Roberto (PP).
O tucano José Luiz Queiroz frisou que uma eventual aprovação do projeto abriria “um precedente perigoso”. “A prefeitura pode nunca mais pagar o Daem. (O projeto) parece mais uma gambiarra. É uma criatividade legislativa”.
FAVORÁVEIS
A bancada governista saiu em defesa da proposta, a começar pelo líder do prefeito. “Se tem calote, já vem sendo dado (sic) há várias administrações”, disse Albuquerque. Ele classificou a ‘dação’ de poços como uma “compensação”. “Tem que ser dita a verdade: quem investe no Daem é a prefeitura municipal”, frisou.
Cícero do Ceasa (PL) disse não entender “onde estaria o calote” da prefeitura, segundo o projeto. “Para mim, o caixa é um só. Até porque, no final das contas, quem arca com as responsabilidades da autarquia é o prefeito”, afirmou.
Custódio seguiu o raciocínio: “em último caso, a dívida do Daem fica para a prefeitura”. A ‘dação’ de poços, analisa o vereador, incrementaria o patrimônio e a valorização da autarquia “em uma eventual concessão”. “O que o pessoal quer é água na torneira”, comentou João do Bar (PP).
RESENHA CAMARÁRIA #22
DIAS CONTADOS
Aconteceu de novo. A desarticulação política do Executivo no Legislativo praticamente selou a sepultura de mais um projeto de lei. A base governista precisou agir de última hora para tentar dar uma sobrevida à proposta de dação de poços em troca do perdão das dívidas da prefeitura com o Daem. A depender da intenção de voto de momento, no entanto, a matéria está rumo aos arquivos.
DEVEDORES, TREMEI!
O líder do prefeito, José Carlos Albuquerque (PSDB) foi, de longe, o mais exaltado entre os defensores do projeto durante toda a sessão desta segunda (15). Em meio à discussão sobre a dívida da prefeitura com o Daem ele afirmou que requisitará à autarquia a relação completa dos maiores devedores. “Vou fazer questão de ler nome por nome na tribuna”, avisou. O primeiro não é segredo para ninguém: Prefeitura Municipal de Marília.
COLEGIAL
A Professora Daniela (PL) resolveu mudar o penteado para a sessão desta segunda (15). Prendeu parte do cabelo para cima com uma chuquinha, com as madeixas caídas para os lados. “Tá parecendo uma estudante de colegial. Parabéns aí, por cuidar da imagem”, elogiou Albuquerque. O afago espontâneo do vereador arrancou gargalhas dos colegas.
PREVISÕES ELEITORAIS
À medida que se aproximam as eleições, crescem as especulações quanto à formação da próxima legislatura. Um ex-integrante do governo municipal, pré-candidato a vereador, cravou que apenas quatro partidos teriam musculatura suficiente para ocupar quase todas as 13 cadeiras: PSDB, Podemos, PP e PSB. Ele, claro, está filiado a um dos quatro.
NA GALERIA
A necessidade de distanciamento de todos que utilizam o plenário da Câmara exigiu uma adaptação na ocupação dos espaços para a realização da sessão na noite desta segunda (15). A imprensa, por exemplo, foi deslocada para a galeria. Único representante presente, o blog se acomodou por lá. A bancada exclusiva dos jornalistas foi ocupada apenas pela equipe da TV Câmara.
COMPANHIA NO PLENÁRIO
Até então restrita à presença apenas do presidente Marcos Rezende (PSD), a sessão remota, agora com expediente completo, acabou por levar mais um vereador para o plenário: o secretário Evandro Galete (PSDB). Ele seguiu à direta do chefe, mas à distância: as leituras dos requerimentos foram feitas de uma das poltronas do semicírculo.
SESSÃO ORDINÁRIA DESTA SEGUNDA (15)
I - PROCESSOS CONCLUSOS
1 – Segunda discussão do Projeto de Lei nº 135/2018, da Prefeitura Municipal, autorizando a Prefeitura Municipal de Marília a desafetar e a alienar ao Departamento de Água e Esgoto de Marília - DAEM, e este a receber os bens que especifica, mediante dação em pagamento de débitos da Municipalidade com serviços de água e esgoto referentes ao período de dezembro de 1991 até a data anterior à vigência desta Lei, que não tenham sido incluídos em parcelamentos anteriores. Dá outras providências. Há emendas. Votação qualificada
PEDIDO DE VISTAS (por Marcos Custódio, aceito por unanimidade)
2 – Primeira discussão do Projeto de Lei Complementar nº 39/2019, do Vereador Delegado Wilson Damasceno (PSDB), modificando a Lei Complementar nº 450/2005, que reestruturou o Instituto de Previdência do Município de Marília - IPREMM, estabelecendo que a convocação do Conselho de Administração se dará também pela publicação no Diário Oficial do Município de Marília. Votação maioria absoluta.
NÃO APRECIADO
3 – Primeira discussão do Projeto de Lei nº 191/2019, do Vereador Marcos Rezende (PSD), considerando de utilidade pública municipal o Centro Espírita Semeadores de Luz.
NÃO APRECIADO
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