Padres afastados da Diocese de Assis acusados de abuso sexual contra ex-seminarista recebem pena máxima do Vaticano. Denúncia não avança na Justiça Comum por prescrição presumida por vítima. Papa Francisco demitiu padre de Marília em 2020 após julgamento de ‘denúncias graves’. Saiba como formalizar sua denúncia
Pouco mais de três anos após formalização de denúncia de abuso sexual por um ex-seminarista, dois padres afastados da Diocese de Assis (SP) foram demitidos pela Igreja Católica.
A pena máxima para sacerdotes, segundo consta no Direito Canônico, foi confirmada ao denunciante em resposta à carta enviada no dia 16 de março ao Tribunal Interdiocesano de Botucatu (SP), sediado em Assis (SP).
O documento assinado pelo vigário judicial, o padre doutor Carlos Roberto Santana da Silva, datado da última segunda (18), informa que os “ex-clérigos” Oldeir José Galdino e Maurílio Alves Rodrigues “foram considerados condenados e demitidos do estado clerical”.
Consta também que o bispo diocesano de Assis, dom Argemiro de Azevedo, já havia sido notificado sobre a conclusão dos processos pelo Dicastério para a Doutrina da Fé ainda no dia 8 deste mês.
Até a data de publicação deste texto, a Diocese de Assis não havia publicado a decisão do Vaticano em nenhum de seus canais oficiais. Procurado pelo blog, o bispo não respondeu. O espaço segue aberto.
O vigário judicial comunica ainda, por fim, que os processos estão “transitados em julgados”, “considerados concluídos e arquivados”. Ou seja: não há mais espaço para qualquer tipo de recurso à Santa Sé.
Procurados pelo blog, ambos os padres, agora demitidos, não se manifestaram. O denunciante, por sua vez, classificou a sentença como um “alívio”. “Estou me sentindo livre novamente”, afirmou.
AFASTAMENTOS
Ambos os padres estavam afastados de suas funções ministeriais desde 31 de maio de 2023. As medidas cautelares foram publicadas por dom Argemiro de Azevedo cinco dias após a revelação das denúncias por este blog.
Das acusações expostas através de códigos canônicos havia, em comum, abuso cometido por clérigo com menor de dezoito anos e, no caso do padre Maurílio, o suposto emprego do sacramento da confissão para indução a práticas sexuais.
Segundo as denúncias, formalizadas em 8 de janeiro de 2021 no Tribunal Interdiocesano de Botucatu, os abusos sexuais ocorreram entre 2002 e 2003, em casas paroquiais, quando o ex-seminarista tinha entre 16 e 17 anos de idade.
De imediato, no dia seguinte à publicação das medidas cautelares pelo bispo, em 1º de junho, os padres tiveram seus nomes excluídos das comunidades onde eram párocos no site da Diocese de Assis (SP).
Padre Maurílio estava à frente da Paróquia São Nicolau, em Assis (SP) e Oldeir da Paróquia São Donato, de Pedrinhas Paulista (SP) – este último foi retirado do cargo de vigário-geral que ocupava havia nove anos.
Ambos passaram pela Faculdade João Paulo II de Marília (SP). Oldeir estudou Filosofia e Teologia entre 1986 e 1992. Maurílio foi diretor entre julho de 2008 e 2016, e professor de 2004 a junho de 2023 – o último ano, afastado.
PRESCRIÇÃO
Além de apresentar denúncia à própria Igreja Católica, o ex-seminarista também registrou boletim de ocorrência na Delegacia de Defesa da Mulher (DDM) em 26 de maio de 2022 “por temer por sua segurança”.
Mas a busca pela Justiça Comum parou por aí. “Eu já sabia da possibilidade de prescrição e nem gastei energia com isso”, afirmou o denunciante ao blog. “Eu não tinha advogado constituído”.
No Brasil, a prescrição de pena em crime sexual é de 20 anos em caso de estupro, contados a partir dos 18 anos da vítima. O critério é mesmo da Igreja Católica desde 2010, após medidas tomadas pelo Papa Francisco.
Aos 38 anos, o ex-seminarista está na idade limite para formalizar sua denúncia na Justiça. Segundo o Código Penal, a pena para o crime de estupro de vulnerável é de 8 a 15 anos de reclusão.
DEMISSÕES EM MARÍLIA
Há quase quatro anos, a Diocese de Marília também demitiu um sacerdote após julgamento de “graves denúncias” pela então Congregação para a Doutrina da Fé – atual Dicastério e antiga Inquisição.
Afastado desde dezembro de 2015 de suas funções ministeriais na Catedral São Bento, o padre Clécio Ribeiro teve sua demissão do estado clerical decretada pelo Papa Francisco “como suprema e inapelável decisão, não sujeita a qualquer recurso”.
O decreto papal data de 28 de maio de 2020. A Circular 12/2020, mas a comunicação oficial da Diocese de Marília sobre a decisão foi publicada apenas em 7 de julho, véspera do 58º aniversário natalício de dom Luiz Antonio Cipolini.
Em 2021, o então padre Manoel Carlos Nery, conseguiu a “graça pedida”, segundo consta em na circular 8/2021, da “dispensa do sagrado celibato e das obrigações inerentes à sagrada ordenação”.
Na prática, ele apenas antecipou a pena que poderia receber do Vaticano devido à acusação que lhe pesava de assédio a um menor de idade enquanto foi pároco da Paróquia Sant’Ana, em Herculândia (SP).
COMO DENUNCIAR
Em caso de abuso sexual por clérigos da Diocese de Marília, o fiel pode recorrer à própria Igreja Católica para formalizar sua denúncia na Comissão Diocesana para a Tutela de Menores e Pessoas em Situação de Vulnerabilidade.
A apresentação pode ser presencial, na Cúria Diocesana, na avenida Nelson Spielmann, 521, no centro, mediante agendamento prévio pelo e-mail comissaotutela@yahoo.com.br ou pelo telefone (14) 3401-2360.
Se preferir, o denunciante pode enviar carta à Cúria – o CEP é o 17.500-970. É imprescindível a comunicação do fato às autoridades policiais. Em Marília, a Central de Polícia Judiciária fica na rua Doutor Joaquim de Abreu Sampaio Vidal, 49.
Este blog também acolhe e investiga denúncias. O ex-seminarista de Assis (SP) recorreu a este canal de imprensa para relatar seu caso, publicado com exclusividade mediante apresentação de documentação. A Igreja admitiu a denúncia, publicamente, somente depois.
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